VALÉRIO MESQUITA
O HOMEM QUE MATOU O FACÍNORA
Valério Mesquita*
Mesquita.valerio@gmail.com
O excepcional faroeste de John Ford bem que merecia ser reeditado. E foi, aqui em Natal. Não precisa citar nomes. A reação, ante duas vidas ameaçadas (a sua e a da esposa) contra a inesperada agressão de um assaltante foi intuitiva e corajosa. Muitas vezes, na estrada do mérito de um homem de bem sempre pode aparecer um lixo desonroso. Qualquer um de nós está sujeito nessa dimensão dos últimos tempos. Não se acabrunhe o meu caro doutor e amigo! A própria Bíblia que anuncia não matarás, tem muita gente boa, santificada, que cometeu homicídios por justificadas razões: Moisés, Josué, Davi e outros tantos narrados nos livros de Gênesis, Reis, Samuel e o Pentateuco.
Em Natal, alguns legalistas e pseudos-defensores dos “direitos humanos”, entendem que “o melhor cidadão, é o cidadão morto”. E explicam: “o cidadão já é uma figura de bem e do bem, com família criada, boas posses e pode ter um excelente velório com grande número de amigos para pranteá-lo. Enquanto, o marginal, não. Esse necessita de oportunidade, de tratamento adequado, prisão passageira - visto poder se “recuperar” e desfrutar o espaço merecido na sociedade”. Meu doutor, este é o mundo em que vivemos: complexo, confuso e contraditório. Sei que você é pra lá de setentão e ficará abalado com esse fato inesperado em sua vida. Lembre-se de sua trajetória profissional, das vidas que suas mãos salvaram e os atos de solidariedade humana praticados em favor dos mais pobres nos hospitais por onde passou.
Não se reprima. A altivez e a conduta retilínea do seu pai o proíbem. Que a justiça faça a sua parte pois você fez a sua para não morrer. Por que o Congresso Nacional não modifica a legislação penal brasileira tão tolerante e conivente com os facínoras que assolam e assaltam o país? Quando o cidadão é vítima da maldade dos bandidos do Brasil, por que a nós outros somente resta a já cansada capacidade de se indignar? Daí, eu relembrar o western do velho John Ford do tempo das diligências. A aplicação da lei era mais fácil. Havia dilemas, angústias, dramas psicológicos, suspense e longas esperas que somente o cinema sabe fazer. Mas, pelo menos, no final, o mocinho sempre triunfava. E o facínora, após liquidado, era problema somente para o xerife. A cidade ficava aliviada com um a menos.
Não vou lhe visitar agora. Quero daqui vê-lo bem e reabilitado dessa aventura vivida na imaginária Abilene natalense, onde você não deixou o facínora vencer, fiel ao ideário de Ford. Há uma assertiva que aprendi repeti-la: “o homem nunca é o mesmo em todos os instantes”. Não se preocupe com os julgamentos apressados. A verdadeira vítima é você. O outro é da sociedade injusta que não o educou e nem o assistiu. As ruas e os bairros de Natal estão repletos de indivíduos assim. Certa vez, comovido pela caridade, por alguns que dormiam sob as marquises das lojas, fui advertido, que, semana passada, duas pessoas tornaram-se reféns. Todo dia, toda hora, os delegados, os governos, as ong’s de defesa aos direitos humanos não oferecem abrigo, reabilitação, justiça social, amparo legal. São dessas condições subumanas que vem o facínora. Logo me vem a lembrança de “Matar ou Morrer”. Mas aí, já é Gary Cooper. Outro filme. Por fim, ofereço o dito bendito que a minha mãe gostava de repetir: “Não há bem que sempre dure nem mal que nunca acabe”.
(*) Escritor
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