segunda-feira, 12 de março de 2012

MARLENE DA SILVA MARIZ, DE SENSIBILIDADE FRANCISCANA, FAZ UMA INTELIGENTE E COMOVENTE BIOGRAFIA (IN MEMÓRIA), DE GIPSE PEREIRA MONTENEGRO.

GIPSE PEREIRA MONTENEGRO
TURMA CONCLUINTE DA ESCOLA DOMÉSTICA DE NATAL, DÉCADA DE 50, ONDE ESTÃO GIPSE E MARLENE MARIZ
MARLENE DA SILVA MARIZ
O AMOR ETERNIZA AS BOAS LEMBRANÇAS.


"A pedido da amiga e historiadora, Lúcia Helena Pereira, passo a escrever minhas lembranças sobre minha querida colega e amiga - Gipse - o que faço, com dupla emoção.
Primeiro esse convite encheu-me de uma certa vaidade, por significar a confiança e reconhecimento da amizade que me ligava à sua amada irmã e madrinha. Por outro lado, porque levou-me a uma viagem ao passado, visitando épocas, lugares, encontrando pessoas, vivendo situações alegres, outras preocupantes, enfim. um pouco da nossa história de vida.
Em março de 1955, conheci Gipse Pacheco Pereira, filha do senhor Abel Antunes Pereira e dona Áurea Pacheco Pereira. À época, frequentávamos o início do semestre letivo da Escola Doméstica de Natal, numa turma com mais de sessenta alunas do terceiro ano. E Gipse chamava atenção por sua beleza, sua alegria e alto astral. Ela era o tipo de moça encantadora, elegante, decidida, solidária e espontânea, logo fazendo amizade com a turma.
Com os passar do tempo, ela ficou conhecida como "a galega de olhos
verdes - azuis" apelido adotado em nossas brincadeiras de românticas adolescentes. Logo nos tornamos amigas. Nessa convivência fui conhecendo a sua família, suas irmãs: Marilene (e filhos), Suely (e filhos), Iara Maria e Lúcia Helena, a mais nova, além de Alberto Cícero, o irmão de criação a quem muito amava, assim como seus pais, Sr. Abel e dona Áurea.
Gipse valorizava muito a família. Como éramos colegas de quarto, durante o quinto ano no internato, trocávamos confidências, falávamos dos nossos planos para o futuro e discutíamos sobre as diversões dos finais de semana. Era ela mesma, "a garota dos olhos verde - azuis" encantando-nos com a sua filosofia de vida, sua visão de mundo, onde não deixava acontecer, logo decidia, afinal, para ela, "as coisas tinham que ser bastante claras".
Através de fotos passei a conhecer a todos. Dessa forma passamos a curtir sua primeira sobrinha, Cristiane, filha de Marilene e Cleanto Waqnderley, a quem Gipse dedicava especial afeto e apego.
Ao término do curso da Escola Doméstica, também, o final de uma etapa
feliz de nossas vidas, cuja convivência deixaria saudades!
E na foto de despedida, da colação de grau, ficou gravada em mim aquela boa recordação das dezoito moças concluintes, algumas, como pássaros, voaram para outras plagas.
Chorávamos quando cantávamos o hino de despedida da escola, cujo primeiro verso, é um poema:
"partimos nós/ partimos nós/ e vós colegas ficais/ temos saudades de vós/
não choraremos jamais..."
Concluído o curso da Escola Doméstica em 1958, Gipse, eu e Elvira Mariz, matriculamo-nos no Atheneu Norte- Riograndense, no curso clássico, mas, não chegamos a concluí - lo, logo no ano seguinte Gipse noivou e abandonou o curso, eu me casei e também não terminei o curso.
Gipse casou-se com o médico cardiologista Antônio de Pádua Borges Montenegro, realizando o sonho de constituir sua própria família.
Depois de casadas continuamos a nossa amizade. Trocávamos visitas e frequentávamos as festinhas de aniversários dos nossos filhos. Nessa época, lembro-me bem, Gipse fazia sucesso por sua elegância e bom gosto no vestir, calçar e pentear seus cabelos louros, além das belas maquiagens de Da Luz e Getúlio!
Em 1967 sofri um acidente e fraturei a bacia, permanecendo acamada durante um mês. Jamais poderia esquecer o gesto de minha amiga Gipse visitando-me duas vezes por semana. Sua presença me animava (é bom lembrar que, numa situação como tal, a presença amiga é benfazeja).
A década de sessenta distanciara-nos da convivência assídua, mediante os inúmeros afazeres. Eu concluíra o curso de licenciatura em história e concurso para professor, passando a lecionar história na UFRN. minha amiga Gispe e sua mana Lúcia Helena faziam o referido curso e, assim, passamos a nos ver mais freqüentemente nos corredores do Campus Universitário.
Em 1974, Gipse concluíra, com sua irmã, o curso de história.
Fomos, então, para a UFPE, no sentido de submetermo-nos à seleção
do mestrado na citada universidade. Instalamo-nos num hotel no centro de Recife, e, aprovadas, passamos a planejar o futuro. E foi Gipse quem traçou os nossos planos, vez que, não queríamos ficar em Recife, afinal, era ela quem tomava as decisões corretas e escolheu um hotel próximo dos pontos de transportes para a UFPE. Assim, ela combinou que viajaríamos no domingo à noite (de Natal para Recife) e regressaríamos na sexta, após a aula (tipo 19 horas).
Gipse transmitia muita segurança. Eu me sentia tranqüila e durante o ano que passamos em Recife, correu tudo bem, sem nenhum atropelo. Foi um ano bom apesar de corrermos muito para assistirmos às aulas, irmos às livrarias, ao comércio e sempre, às segundas, íamos ao cinema, pois segundo ela, isso impediria o estresse e aliviaria as saudades de casa.
Era interessante como chegávamos ao hotel, após as aulas, e ela dizia: "bom, já tomei banho e enquanto você toma o seu, dormirei por vinte minutos antes de recomeçarmos os estudos"...
E, assim, fazia, dormindo, exatamente, por vinte minutos, despertando
bem disposta para retomarmos os trabalhos acadêmicos.
Inteligentíssima, Gipse tinha uma boa linha de raciocínio e facilidade para o entendimento dos textos, que muitas vezes desconhecíamos, sem domínio em determinadas áreas de interpretação. Fizemos bons colegas na UFPE e todos gostavam dela, achavam - na formidável e espontânea, de risada franca, simpática e carismática.
A maioria dos nossos colegas era de outros Estados do Nordeste.
Nas sextas saíamos de carreira para pegarmos o táxi até a Rodoviária.
Vale ressaltar o quanto essas viagens eram animadas, conversávamos
durante todo o trajeto, sem faltar assunto. Na ida eram os acontecimentos do final de semana, os filhos, nossas casas!
Na volta, eram avaliações da semana, aulas, trabalhos e leituras que havíamos feito. Era sobremaneira incrível o quanto me tornei dependente das opiniões e decisões de minha amiga, tudo que
ela resolvia e decidia era do meu contento.
Vivemos muitas histórias interessantes. Sempre estávamos juntas em
quase todos os lugares, em salas de aulas, na cantina, nos corredores, na biblioteca e na sala de leitura.
Eu estava envolvida à vida de Gipse e vice-versa. Adorava estar na sua companhia, nas boas e más situações, e quando fazia compras para sua casa, era algo fascinante. Da mesma forma era maravilhoso participar dos preparatórios para a festa de 15 anos de sua primogênita - Maria Madalena.
Em tudo isso ela encontrava sempre, bons motivos para nos
divertirmos, àquela época, Natal ainda não tinha supermercados e alguns produtos eram de difícil aquisição. Ela não se aperreava, comprava em Recife, principalmente pernil de presunto que trazíamos em depósito de isopor. Parecíamos vendedoras de picolé.
Jamais nos desentendemos. Eu sempre acatava suas boas sugestões. Relembro que, algumas vezes, as suas crianças tinham tratamento dentário e Gipse levava-as com o motorista, na sexta-feira, e após a consulta, voltávamos todos juntos.
Na disciplina história do Nordeste, foi organizada uma viagem da turma da UFPE para Natal, com vistas a uma visita à Barreira do Inferno. Ela, então, aproveitou e ofereceu um café da manhã com tudo de melhor, e os nossos colegas saíram encantados com a hospitalidade da hostess natalense.
Ao completar quarenta anos, telefonou-me convidando da seguinte forma: " ...vou fazer como Elizabeth Taylor, abrir os salões da minha casa, para comemorar minha grande data"...
E foi a festa mais bonita que vi, com as amigas nos jardins da sua linda
casa, onde recebia familiares e amigos.
Inteligente, criativa e organizada, Gipse concluiu todos os créditos das disciplinas do mestrado, em apenas um ano, enquanto eu deixei uma disciplina para o ano seguinte.
Ela planejou no ano seguinte, fazer uma pesquisa no Rio de Janeiro, para a dissertação de sua tese:
"Os americanos em Natal, na segunda guerra mundial", tendo, como orientador, seu primo e escritor Nilo Pereira Assim sendo, ela seguiu para a cidade maravilhosa, no sentido de levantar a documentação no arquivo nacional. Se Gipse tivesse tido o tempo necessário, teria realizado um excelente trabalho, pelo seu inegável talento, pela precisão na pesquisa, pela inteligência e todos os dons que Deus lhe deu. Essa dissertação teria sido uma grande contribuição para a historiografia potiguar!
No seu regresso do Rio de Janeiro, o chefe do Departamento de História comunicou-me o grande problema de saúde que atingiu minha amiga. A notícia pegou-me como um choque, sentei-me para não cair. Em seguida fui visitá-la. Ela recebeu-me com o mesmo otimismo, esperando vencer
aquela árdua travessia. Não fazia mais de um ano de sua chegada, diagnosticada de um câncer (acompanhei-a por vários e vários meses), quando, finalmente, Lúcia Helena telefonou-me para dizer: "se quiser ver sua amiga, venha depressa, ela está nos deixando".
Assim, Gipse foi embora deixando muitas lições de vida, amor, caridade humana e solidariedade. Dou graças a Deus por tê-la colocado em meu caminho. e agradeço à Lúcia Helena a oportunidade de relembrar Gipse, afinal, lembrá-la é sempre um prazer.

natal, 15 de dezembro de 2004.

Marlene da Silva Mariz". (*)
Prof° de história da UFRN (aposentada)

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Querida Lúcia Helena,

Achei simplesmente fantástico o vale verde, tão querido do Ceará Mirm, do qual ela tanto falava nos poemas da avó Madalena. E a foto onde estava tão natural me levou ao passado, a nossa adolescência e parecia estar vendo, minha querida amiga e sua irmã, figura que marcou as nossas vidas pela sua presença carinhosa e amiga. Também achei o máximo a foto da nossa formatura, essa foto é histórica.

Um grande e carinhoso abraço, Marlene.

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