PÚBLIO JOSÉ - JORNALISTA E ESCRITOR
O ABC DO APARTHEID
Públio José – jornalista
(publiojose@gmail.com)
O anúncio aconteceu recentemente. De acordo com dados estatísticos, divulgados sobre o quadro educacional brasileiro, cerca de 13% da população dos 15 anos em diante são analfabetos. É um dado estarrecedor. Por esses números teríamos no Brasil em torno de 20 milhões de analfabetos. Em Natal, pelos mesmos números, o cálculo aproximado totaliza quase 100 mil pessoas. Isso significa que caminham diariamente pelas ruas de Natal, cruzam seus sinais, habitam seus espaços em torno de 100 mil analfabetos, pessoas quase que totalmente excluídas dos inúmeros benefícios que o conhecimento das letras nos assegura. Através desses números podemos concluir que é quase impossível, carregando nas costas tal contingente de analfabetos, Natal atingir um grau consistente de progresso, de bem estar social.
Por qualquer lado que se faça uma análise desse quadro, desse verdadeiro “apartheid” social, fica difícil de antever para quem sobra o maior peso do problema. Se para os analfabetos, que vivem essa situação tenebrosa de seres humanos de quinta categoria, padecendo todos os sofrimentos advindos de pertencerem a essa raça de excluídos, ou se do restante da população, obrigada a sustentar, mesmo que da pior maneira possível, um exército enorme de pessoas desqualificadas, despreparadas, desprotegidas e sem a menor perspectiva de melhoria de vida. O que se infere disso tudo é que os dados apontados agora denigrem, depõem contra todo e qualquer planejamento governamental voltado para a área social (se é que existe!), além de funcionarem como um verdadeiro escarro na cara dessa pobre gente que perambula pelas ruas à cata de restos de comida, sem ler nem a embalagem da sujeira que está comendo.
Isso pelo lado humanitário. Porque pelo lado econômico fica mais difícil ainda Natal crescer, pretender enveredar pelo caminho do progresso, passar a integrar o seleto número de cidades com um bom índice de desenvolvimento, tendo que carregar nas costas esse elevado contingente de párias, subempregados, desempregados, desocupados, além do mais obrigada a providenciar para eles assistência médica, moradia e outros benefícios sociais difíceis de segurar nas atuais circunstâncias. É público e notório que essas pessoas dificilmente pagam impostos ou geram qualquer tipo de riqueza - nem fazem as tais circularem - pois têm um poder aquisitivo quase nulo, sobrevivendo da ajuda de amigos e parentes e das inúmeras casas de caridades existentes na cidade. Sem terem opção para diversificar seus destinos, terminam se colocando como verdadeiros pesos mortos para o restante da sociedade.
E o que fazer? Continuar como está traz para todos um fardo duro de suportar e investir na sua alfabetização nos traz um retorno incerto. Nem todo alfabetizado dá continuidade a uma vida ligada à leitura e a novos aprendizados. Muitos, tendo idade avançada, não têm a menor condição de disputar algum espaço no mercado de trabalho e logo em seguida ao curso de alfabetização voltam ao estado de analfabetos ou de semi-analfabetos – o que não traduz nenhuma diferença. Outros se desvanecem também logo cedo tendo em vista que, atualmente, ser alfabetizado significa pouco ou quase nada diante de um mercado que está transformando em trabalhador braçal, à procura, portanto, de um salário um pouco maior do que o mínimo, até quem trafega por aí portando um diploma de doutor.
Eu não sei a resposta que você tem para essa dolorosa questão. Nem passo a fazer um mau julgamento a seu respeito se você não souber o que dizer sobre o assunto. É realmente complicado. Eu tenho minha opinião, além do mais porque, na qualidade de observador da cena brasileira e natalense, já tinha me debruçado sobre o problema, sabedor de percentual tão alto de analfabetismo entre nós. Aliás, o número que tinha chegado ao meu conhecimento era de exatos 15% de analfabetos em Natal. O percentual divulgado agora é um pouco menor, embora a diferença não venha atenuar chaga social tão profunda. Eu tenho uma proposta de alfabetização em larga escala por acreditar na recuperação de muitas dessas pessoas. E por acreditar também que mais vale um alfabetizado à procura de uma chance do que um analfabeto sem a menor perspectiva de vitória em sua vida. É bem melhor assim, não é verdade?
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